O recente tarifaço global, impulsionado pelas medidas protecionistas de Donald Trump, reacendeu tensões entre Estados Unidos e China e colocou o mundo em alerta. À primeira vista, trata-se de mais um capítulo da já conhecida disputa geopolítica. Mas os desdobramentos econômicos podem ser profundos – e silenciosos. Cadeias de suprimentos impactadas, inflação pressionada e margens comprimidas devem obrigar empresas e empreendedores brasileiros a repensarem suas estratégias. No meio desse cenário, creio que o crédito pode emergir como um dos poucos vencedores.
Empresas de tecnologia, especialmente as que dependem de hardware, são as primeiras atingidas. Com a alta de tarifas, o custo de importação aumenta, pressionando preços e, consequentemente, o consumo. Como nem todos os clientes estão dispostos a absorver o reajuste, o resultado é claro: ou se reduz a margem de lucro ou se cresce menos.
Não por acaso, o mercado já está precificando esse cenário. Gigantes do setor tech vêm registrando quedas expressivas em suas ações. De acordo com o UBS, empresa global de análises financeiras, uma retração de apenas 1% no PIB americano pode provocar queda de 6,9% nos lucros das empresas listadas no S&P 500, instituições de capital aberto registradas na bolsa de valores americana. No modelo de valuation, esse impacto é devastador.
No universo do software, o efeito é menos direto, mas não menos relevante. Os orçamentos de tecnologia são integrados, ou seja, o mesmo CIO que cancela um projeto por conta do aumento de custos com hardware vai, inevitavelmente, rever seus gastos com licenças, plataformas e soluções digitais. O efeito dominó é real e atinge até quem parecia imune.
Embora o tarifaço tenha origem nos EUA, os mercados emergentes, não saem ilesos e o Brasil está nessa lista. Com a China buscando novos fornecedores diante das restrições impostas por Trump, aumenta a demanda por commodities brasileiras, como soja, minério de ferro e carne. Em um primeiro momento, isso pode parecer positivo. Mas há um efeito colateral que deve ser considerado, ao exportar mais, o país reduz sua oferta interna, o que pressiona ainda mais os preços. Somado a desvalorização ainda maior do real frente ao dólar, teremos um cenário inflacionário ainda mais complexo.
Para as empresas brasileiras, o custo dos insumos importados sobe, enquanto a margem de manobra nos orçamentos encolhe. O ambiente de negócios fica mais desafiador, exigindo criatividade e novas estratégias para proteger resultados. Nesse ambiente turbulento, há uma variável que se mantém relativamente imune às tarifas: o dinheiro. Ou seja, oferecer crédito continua funcionando, o que muda são os juros e o apetite por risco. E é justamente nesse ponto que surgem oportunidades estratégicas.
Empresas que desejam manter ou ampliar suas margens de lucro vão precisar explorar novos modelos de monetização. Um dos caminhos mais promissores é usar a própria base de clientes como alavanca financeira, por meio da criação de FIDCs (Fundos de Investimento em Direitos Creditórios) ou estruturas similares. Na prática, isso significa se tornar um “mini banco”, antecipando recebíveis e girando o caixa com mais eficiência, sem depender exclusivamente das instituições tradicionais.
No Brasil, onde a cultura bancária é consolidada e o spread ainda é alto, esse modelo encontra terreno fértil. Em momentos de inflação elevada, o setor financeiro tende a se beneficiar.
Mariana Padilha (41) 99636-1212 [email protected]